Sentada à mesa, em silêncio, eu mastiguei. Ignorando aquele olhar que me engolia. Que esperava respostas. Mastiguei palavras duras, com gosto de massa crua, por causa daquele pão mal assado do café da manhã.
Mastiguei palavras burras enquanto o tiquetaquear do relógio evidenciava que minha resposta já demorava demais. Eu continuei olhando para o pão e pensei que aquela padaria era uma droga. Mas o pão era mais barato que em qualquer outro lugar.
Quem me encarava já era só sombra. Era como se aquele corpo tivesse sido absorvido pela cena. Como quando se acorda no meio da noite e se leva um susto com um invasor no quarto e, em seguida, se percebe que é só uma roupa pendurada no cabideiro. Era como se aquele olhar em agonia fosse só um casaco quase limpo do dia anterior. "É como se você fosse um casaco", pensei. Mas não disse. Aquilo nada tinha a ver com a conversa e seria perfeito pra quebrar o silêncio se aquilo fosse uma história. Mas não era. Aquilo era a vida.
Tomei um gole das palavras com gosto de chá de frutas vermelhas. Doce demais para aquela cena. Se fosse uma história, seria café. Mas eu não tomo café. Nem mesmo em realidades hipotéticas.
Havia algo a ser dito, e então eu sorri. Eu levantei os olhos e sorri aquele sorriso que qualquer um que me conheça bem, já viu mais de uma vez. Aquele sorriso de "eu queria chorar, mas vou sorrir." Que acaba em choro num intervalo de 10 a 100 segundos, dependendo da reação de quem me vê.
Eu ruminei aquelas palavras secas e pesadas, que não cabiam no estômago, nem no coração.
E quem me assistia, não entendeu. Nem o silêncio, nem o sorriso, nem as lágrimas que agora já aqueciam o topo do rosto, mas que não chegariam a rolar pela face.
Quem me assistia, estava inerte e confuso enquanto eu sentia aquelas palavras embrulharem o meu estômago e voltarem à boca. Mas elas não passariam da boca. Aquelas palavras foram engolidas à força, porque elas eram minhas. Era minha aquela dor. Aquela loucura não pertencia à mais ninguém, e assim permaneceria.
Sem pé nem cabeça
Há 10 anos
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